O evangelho de João esteve sob fogo cruzado nos séculos recentes por sua incrivelmente alta Cristologia. Somente com base nisto certos críticos da forma têm rejeitado o livro como tendo qualquer autenticidade histórica, assumindo (sem fundamento) que tal alta Cristologia só poderia ter-se desenvolvido depois de um bom tempo de "formulações teológicas" e daí datam sua escrita como sendo no segundo século. Felizmente, nem todos os estudiosos compartilham das mesmas suposições sem fundamento.
A pessoa de Cristo como apresentada no Evangelho de João é de fato de um excepcionalmente alto caráter - João declara que Jesus é "a Palavra que se tornou carne" (João 1:14). Ele diz que esta Palavra é eterna, sempre esteve "com" Deus (pros ton theon) e de fato compartilha a própria essência de Deus (João 1:1). João descreve Jesus como o único Deus (monogenes theos) em João 1:18. Ele retrata Jesus dizendo que Ele é o caminho, a verdade e a vida - que a própria vida e salvação do homem depende de sua relação com Ele (um clamor não pequeno de blasfêmia para uma mera criatura!), e o Evangelho tem seu clímax na confissão de Tomé de Jesus como seu "Senhor e Deus".
Apesar das evidências da Deidade do Senhor Jesus Cristo serem numerosas neste livro, um conjunto destas evidências tem sempre fascinado os teólogos. Jesus atribui a frase específica ego eimi a Si mesmo frequentemente no Evangelho de João, e um número de vezes ele assim faz de forma tão fértil, não provendo qualquer predicado imediatamente identificável. O registro de João destas palavras também é significante, já que ele provê colocações bastante óbvias para estas palavras, enfatizando sua importância. Há alguma importância nesta frase? Qual é seu propósito e significado? Esta frase apresenta ainda outro aspecto da Deidade de Cristo? Este será o tema da seguinte investigação.
Uso de ego eimi no Evangelho de João
A frase específica ego eimi ocorre 24 vezes no Evangelho de João. Dezessete destas vezes é seguido por um predicado claro1. Alguns destes exemplos seriam João 6:35, "Eu sou o pão da vida" (ego eimi ho artos tes zoes) ou João 10:11, "Eu sou o bom pastor " (ego eimi ho poimen ho kalos). Três vezes o uso não cai em uma categoria clara - estes seriam 4:26, 6:20 e 9:9. Em 4:26 Jesus diz à mulher no poço, "Eu sou, aquele falando contigo" (ego eimi, ho lalon soi) que faz lembrar estranhamente da interpretação da LXX (Septuaginta) de Isaías 52:6 (ego eimi autos ho lalon). Em 6:20 ela parece ser uma identificação bastante direta aos discípulos assustados no barco2. E em 9:9 nós achamos o homem que foi curado de cegueira insistindo que ele foi de fato o homem de quem eles falavam. Este último exemplo é parecido às palavras que Jesus profere a eles, em que a frase vem no final da oração e busca em outro lugar por seu predicado.
Dados os usos acima, ficamos com 7 usos que tem sido descritos como "absoluto"3. Estes seriam João 8:24, 8:28, 8:58, 13:19, 18:5, 18:6 e 18:8. São estas sete passagens que compõem o volume da discussão a respeito do uso de ego eimi por João. Para o bem do exame mais exato, as transliterações destas frases são providas abaixo:
- João 8:24: ean gar me pistuesete hoti ego eimi
- João 8:28: tote gnosesthe hoti ego eimi
- João 8:58: prin Abraam genethai ego eimi
- João 13:19: hina pisteusete hotan genetai ego eimi
- João 18:5: legei autois Ego eimi
- João 18:6: hos oun eipen autois Ego eimi
- João 18:8: eipon humin hoti ego eimi
João usa esta frase de Jesus mais que qualquer outro escritor. A frase ocorre em Marcos 14:62-64 também, contudo. Deve ser notado que na lista acima, a própria frase vem no fim da oração em cada exemplo. Isto terá significado quando o embasamento de João na Septuaginta for examinado.
Os principais versos que vão passar por exame aqui são 8:24, 8:58, 13:19, e 18:5-6. Na tradução do autor estas passagens são lidas como se segue:
- João 8:24: "Então eu disse a vocês que vocês irão morrer em seus pecados, pois a menos que vocês creiam que eu sou, vocês irão morrer em seus pecados." João 8:58: "Jesus disse a eles, "Verdadeiramente, verdadeiramente, eu digo a vocês, antes de Abraão nascer, eu sou."
- João 13:19: "De agora em diante eu digo a vocês antes que isto aconteça para que quando acontecer, vocês possam acreditar que eu sou."
- João 18:5-6: "Eles O responderam, "Jesus o Nazareno." Ele disse a eles, "eu sou". E Judas também, aquele que O traiu, estava em pé com eles. Então quando Ele disse a eles, "eu sou", eles recuaram e caíram no chão."
Tradução de ego eimi
Antes que o significado e importância exatos de ego eimi no evangelho de João poderem ser adequadamente abordados, a tradução apropriada da frase deve ser determinada. Há um número muito pequeno de traduções que evitam uma tradução direta do indicativo presente ego eimi. Moffat o traduz, "Eu tenho existido antes de que Abraão ter nascido!" O Novo Testamento do Século Vinte tem, "antes de Abraão existir eu existi." Kleist e Lilly tem "Eu estou aqui - e eu estou antes de Abraão!" C. B. Williams dá "Eu existi antes de que Abraão nascesse." Schonfield traduz a última oração "Eu existi antes de Abraão nascer." E o espírita Johannes Greber (que clama ter recebido sua tradução de um espírito!) tem, "Eu sou mais velho que Abraão." A própria tradução das Testemunhas de Jeová, a Tradução do Novo Mundo, traduz ego eimi como "Eu tenho sido".
Muitas destas traduções estão alegadamente vendo a frase como o que Robertson chama de "presente progressivo ". Robertson escreve,
Este é um nome pobre no lugar de um melhor para o presente de uma ação passada ainda em progresso. Normalmente um advérbio de tempo (ou adjunto) acompaha o verbo... Frequentemente ele tem que ser traduzido para o Inglês como um tipo de "perfeito progressivo " ('tem sido'), apesar, é claro, de que é culpa do Inglês..."O presente durativo em tais casos une os tempos passado e presente em uma frase " (Moulton, Prol., p. 119)... é uma expressão comum no Novo Testamento. Em João 8:58 eimi é realmente absoluto"4.
Há muitos exemplos na narrativa ou conversação histórica onde o grego usará um verbo no tempo presente que é melhor traduzido no inglês pelo perfeito. João 15:27 seria um bom exemplo: "porque você tem estado comigo desde o princípio". O verbo, este, está no tempo presente, mas o contexto deixa claro que é em referência a tanto passado como presente, ou, como Moulton disse, ele "junta passado e presente em uma frase". Robertson nota corretamente que é uma expressão comum no Novo Testamento, apesar de que ele também adiciona o fato que, em sua opinião, João 8:58 é "absoluto" e deveria ser traduzido como tal (como ele sempre faz em seu trabalho5). Deveria também ser notado que é a deficiência do inglês a ser culpada pela tradução - colocar peso no significado do tempo perfeito inglês quando traduzir o presente grego desta forma seria um erro.
Então porque não deveria João 8:58 ser traduzido desta forma? Por que tão poucas traduções seguem este caminho? Porque traduzir assim seria perder o contexto e conteúdo completo do que está sendo dito! A vasta maioria dos tradutores vêem, como muitos comentadores também, que há uma clara diferenciação sendo feita aqui entre a existência derivativa de Abraão e a eterna existência do Senhor Cristo. Que isto é entendido pelos tradutores de nossas modernas edições pode ser percebido por uma olhada nas traduções que traduzem esta frase tanto como "eu sou" ou "Eu Sou " ou "EU SOU":
King James, New King James, New American Standard Bible, New International Version, Philips Modern English, Revised Standard Version, Today's English Version, Jerusalem Bible, New English Bible, American Standard Version, New American Bible, Douay, Young's Literal Translation, Berkeley Version, Norlie's Simplified New Testament, New Testament in Modern English (Montgomery), New Testament in Modern Speech (Weymouth), Wuest's Expanded Translation, Amplified New Testament, New Testament (Swann), Aldine Bible, Four Gospels (C. C. Torrey), Confraternity Version, Four Gospels (Rieu), New Testament (Knox), Concordant Literal New Testament, Anchor Bible, Rotherham, Holy Bible in Modern English (Fenton), Bible in BASIC English, Better Version (Estes), Sacred Writings (A. Campbell), New Easy-to-Read Version, New Testament for the New World.
Este escritor não está ciente de uma simples edição, produzida por um time ou grupo de estudiosos, que traduz ego eimi em João 8:58 em um tempo perfeito. Mesmo aqueles que não vêem aqui uma referência à Deidade de Cristo (tal qual Barrett6) não mudam a tradução para outra coisa. Pelo contrário, muitos estudiosos corretamente apontam o mesmo contraste de verbos como visto no prólogo de João (entre o aoristo ginomai e o imperfeito en) assim como o mesmo tipo de diferenciação encontrado na tradução da LXX de Salmos 90:27. Eles também reconhecem que a resposta dos Judeus seria um tanto forte se isto fosse simplesmente um clamor de insignificante pré-existência. A frequentemente repetida acusação de blasfêmia como encontrado em João deixa isto claro. De preferência, o uso de um termo usado pelo próprio Deus (como será mostrado adiante) seria suficiente para dar resposta ao verso 59.
A frase era entendida assim pela igreja primitiva também. Ireneu mostrou familiaridade com ela como "Eu sou"8 assim como Orígenes9 e Novaciano10. Crisóstomo escreveu, "Como o Pai usou esta expressão, "Eu sou", assim também usou Cristo; pois isto significava Existência contínua, sem referência ao tempo. Em qual relato a expressão pareceu a eles ser blasfema"11. O contexto desta passagem é de longe muito forte para permitir ser traduzida como uma simples narrativa histórica, resultando na conversão do presente indicativo em um tempo perfeito. Alford adiciona,
"Como Lucke destaca, toda explicação imparcial (sic) destas palavras deve reconhecer nelas uma declaração da pré-existência essencial de Cristo. Todas as interpretações como 'antes de Abraão se tornar Abraão' isto é, pai de muitas nações (Socino e outros), e como 'eu fui predeterminado, prometido por Deus' (Grotius e os intérpretes Socinianos), são um pouco melhor que evasivas desonestas. A distinção entre foi feito (ou nasceu) e sou é importante. O presente, eu sou, expressa existência essencial, veja Colossenses 1:17, e era frequentemente usado por nosso Senhor para declarar Sua divina Essência. Neste verso a Divindade de Cristo está envolvida; e isto os Judeus entenderam claramente, por sua conduta em relação a Ele"12.
O embasamento vetero-testamentário de ego eimi
Uma discussão extensiva deste assunto está além do escopo deste artigo13. É suficiente dizer que a posição tomada por este escritor reflete um consenso de opiniões de vários estudiosos, que é que a mais próxima e lógica conexão entre o uso de João de ego eimi e o Velho Testamento é encontrado na tradução da Septuaginta da frase hebraica ani hu nos escritos (principalmente) de Isaías14. É verdade que muitos vão diretamente para Êxodo 3:14 para o embasamento, mas se sente que a menos que alguém primeiro estabeleça a conexão com a citação direta de ego eimi na Septuaginta, a conexão com Êxodo 3:14 será de alguma forma tênue.
A Septuaginta traduz a frase hebraica ani hu como ego eimi em Isaías 41:4, 43:10 e 46:4. Em cada uma destas instâncias a frase ani hu aparece no fim da oração, e assim é traduzida (ou pontuada) na LXX (assim como nestes sete exemplos em João). A frase ego eimi aparece como a tradução de algumas outras poucas em Isaías de forma que são significantes a esta discussão. Ela traduz o hebraico anoki anoki hu como ego eimi em 43:25 e 51:12. Uma vez (52:6) ani hu é traduzido como ego eimi autos (basicamente uma forma mais enfatizada ainda). E uma vez (45:18) nós encontramos ego eimi kurios por ani Yahweh! Esta última passagem é provocativa no sentido de que é o contexto da criação, um ato atribuído a Jesus por João (João 1:3) e outros escritores neo-testamentários (Colossenses 1:16-17, Hebreus 1:2-3).
O uso de ani hu por Isaías é um eufemismo para exatamente o próprio nome de Deus. Alguns vêem uma conexão entre ani hu e Yahweh como ambas referindo-se a ser15. Isto carregava grande peso pelos Judeus como é visto em 8:59 e sua reação ao uso da frase pelo Senhor. Se alguém deseja dizer que Jesus não falava grego, mas aramaico, a dificuldade não é removida, pois a identificação teria sido mais clara!
Parece haver uma conexão direta entre a Septuaginta e o uso de ego eimi por Jesus. Em Isaías 43:10 nós lemos, "que vocês devem saber, e acreditar, e entender, que eu sou Ele" (tradução pessoal). Na LXX isto é traduzido assim: hina gnote kai pisteusete kai sunete hoti ego eimi. Em João 13:19, Jesus diz aos discípulos, "de agora em diante eu digo a vocês antes que isto aconteça para que quando acontecer, vocês possam acreditar que eu sou." (tradução pessoal). Em grego a última frase é hina pisteusete hotan genetai hoti ego eimi. Quando alguém remove as palavras estranhas (tais quais hotan genetai que conectam a última oração à primeira) e compara estas duas passagens, este é o resultado:
- Isaías 43:10: hina pisteusete ... hoti ego eimi
- João 13:19: hina pisteusete ... hoti ego eimi
Mesmo que alguém aqui teorize que o próprio Jesus não tentou fazer tal conexão óbvia entre Ele mesmo e Yahweh (o que seria suficientemente difícil de fazer!) alguém deve responder a questão de por que João, sendo obviamente familiar com a LXX, colocaria intencionalmente este tipo de paralelismo.
Outro paralelo entre o uso de ego eimi em João 13:19 e seu uso em Isaías tem relação com o fato de que em 13:19 Jesus está dizendo a eles o futuro - um dos mesmos desafios aos falsos deuses lançados por Yahweh nas passagens de Isaías sob consideração (o chamado "julgamento dos falsos deuses) Esta conexão é direta em Isaías 41:4, "Quem operou e fez isto, chamando as gerações desde o princípio? Eu o SENHOR - o primeiro, e com os últimos - eu sou Ele". Aqui o "chamado" das gerações - o próprio tempo - é parte do uso de ani hu. O mesmo é verdade em João 13:19. Nas mesmas referências do capítulo do livro de Isaías acima, no verso 22 lemos, "Tragam seus ídolos, para nos dizer o que vai acontecer. Diga-nos o que as coisas passadas foram, de forma que possamos considerá-las e saber seu resultado final. Ou declare a nós as coisas que virão..." Que esta referência ao conhecimento do futuro apareceria na mesma seção que usa ani hu como o nome de Deus, e que isto seria introduzido pelo próprio Senhor no mesmo contexto em João 13:19, é significante de fato.
Daí, apesar de alguns facilmente rejeitarem a conexão ani hu/ego eimi16, ou ignorar o conjunto17, a informação parece forte de que esta conexão foi pretendida pelo próprio João em seu uso.
Uso Joanino de ego eimi - Interpretação
Não é difícil entender porque tem havido muitos que não desejaram fazer a conexão que João faz entre Jesus e Yahweh. Ninguém pode fazer esta identificação fora de um entendimento trinitário do próprio Evangelho, como ninguém pode certamente identificar Jesus como o Pai no Evangelho de João, daí, se Jesus é identificado como ego eimi no sentido do ani hu vetero-testamentário, então se é deixado com duas pessoas compartilhando uma natureza que é Deus, e isto, quando encontra a discussão de João do Espírito Santo, se torna a base para a doutrina da Trindade! De fato, muitas das rejeições do bem claro uso de ego eimi em João 8:24, 8:58, 13:19 e 18:5-6 encontram sua orígem em teologias pré-concebidas18 que são quase unitárias, subordinacionistas, ou tão enamoradas do racionalismo naturalista como ser antisuper-natural. Um intérprete que é teimoso em rejeitar as palavras das Escrituras como simplesmente "tradição" (e daí não autorizado) ou interpretar as Escrituras em contradição consigo mesmas (como em uma violação do monoteísmo estrito no posicionamento de um ser que é quase-deus, poderoso, mas não "Todo-Poderoso") será bastante pressionado a evitar as conclusões óbvias da apresentação de João. A menos que alguém achasse difícil acreditar que João identificaria o carpinteiro da Galiléia como o próprio Yahweh, poderia ser apontado que ele fez justamente isto em João 12:39-41 por citar a visão de Isaías do templo de Yahweh em Isaías 6 e então concluir por dizer, "Estas coisas Isaías disse porque ele viu Sua glória e ele falou sobre Ele". O único "Ele" no contexto é Jesus; daí, para João, Isaías, quando viu Yahweh no Seu trono, estava na verdade vendo o Senhor Jesus. João 1:18 diz tão bem quanto.
É evidente que tal inalcançável e na realidade estonteante clamor como feito pelo Senhor Jesus em João 8:24, 58 é difícil de aceitar fora da mais alta estima de Sua pessoa. De fato, Agostinho escreveu,
"...toda a infelicidade dos Judeus não era que eles tivessem pecado, mas morrer em pecado... Nestas palavras, 'A menos que vós creiais que Eu sou', Jesus não quis dizer nada além disto, 'A menos que vós creiais que Eu sou Deus, vós morrereis em vossos pecados'. É bom para nós, graças a Deus, que ele disse a menos que vós creiais, e não a menos que vós entendeis"19.
Mas o uso de ego eimi poderia resistir tanto peso? Apesar de que ser um "estudioso" não garante infalibilidade no julgamento, poderia pelo menos prover confiança de entendimento factual. Dado isto, os estudiosos parecem sentir que ele pode.
Leon Morris escreveu,
" 'Eu sou' deve ter a máxima importância que ele pode ter. É, como nós já tivemos ocasião de notar... no estilo da deidade. " (em uma nota de rodapé na mesma página:) "ego eimi na LXX traduz o hebraico ani hu que é a forma que Deus fala (cf. Deuteronômio 32:39; Isaías 41:4, 43:10, 46:4, etc.). O Hebreu pode carregar uma referência ao significado do nome divino Yahweh (cf. Êxodo 3:14). Nós deveríamos quase certamente entender o uso de João do termo como um reflexo do uso na LXX. É o estilo de deidade, e ele aponta para a eternidade de Deus de acordo com o entendimento mais estrito da natureza contínua do presente eimi. Ele continuamente É. Cf. Abbott: "tomado aqui, juntamente com outras declarações sobre as quais Jesus É, parece recorrer aos Fariseus acreditarem que o Filho do homem não é apenas o Libertador mas também um com o Pai na unidade da Divindade" (2228)"20.
Warfield escreveu sobre isto,
"...e novamente, com a linguagem mais impressionante possível, Ele declara...: "Verdadeiramente, verdadeiramente, eu digo a vós, antes de Abraão ser, Eu sou", de onde Ele clama para si mesmo o atemporal presente de eternidade como Seu modo de existência"21.
O grande expositor J. C. Ryle nota,
"Vamos cuidadosamente notar que forte prova temos aqui da pré-existência e divindade de nosso Senhor Jesus Cristo. Ele aplica a si mesmo o mesmo nome que Deus se fez conhecido quando Ele se comprometeu a redimir Israel. Foi "EU SOU" que os trouxe para fora da terra do Egito. Foi "EU SOU" que morreu por nós na cruz. A espetacular força da fundação da esperança de um pecador aparece aqui. Acreditando em Jesus nós descansamos na divindade, em Um que é Deus e também homem.
Há uma diferença nos verbos gregos empregados aqui que nós devemos cuidadosamente notar. O grego para "era" é bem diferente do grego para "sou". É como se nosso Senhor dissesse, "Antes de Abraão nascer, eu tenho uma existência individual e eterna"22.
Lutero, como Agostinho antes dele, escreveu em termos certos:
"O Senhor Cristo está nervoso no íntimo e diz: "Vocês querem saber quem sou Eu? Eu sou Deus, e isto no sentido mais pleno. Façam como quizerem. Se vocês não acreditam que Eu sou Ele, então vocês não são nada, e vocês deverão morrer em seus pecados." Nenhum profeta, apóstolo ou evangelista pode proclamar e dizer: "Creiam em Deus, e também creiam que Eu sou Deus; do contrário vocês estão perdidos"23.
A.T. Robertson certamente não viu nenhum problema linguístico aqui:
Eu sou (ego eimi). Sem dúvida aqui Jesus clama existência eterna com a frase absoluta usada por Deus. O contraste entre genesthai (entrada na existência de Abraão) e eimi (existência atemporal) é completa. Veja o mesmo contraste entre en em 1:1 e egeneto em 1:14. Veja o contraste também em Salmos 90:2 entre Deus (ei, art) e as montanhas (genethenai)"24.
E finalmente, William Hendrickson coloca bem diretamente:
"O "Eu sou" aqui (8:58) lembra um dos "Eu sou" em 8:24. Basicamente, o mesmo pensamento é expresso em ambas passagens; a saber, que Jesus é Deus!"25.
Este escritor sente que não haveria maneira de João ter sido mais óbvio em suas intenções de investir em ego eimi um significado além da simples função de identificação que ele pode, e em algumas vezes, desempenha. Em 8:58 os Judeus pegam algumas pedras para apedrejar Jesus. As outras duas vezes que isto acontece são bem logo após reivindicações de deidade também - a primeira em João 5 onde Jesus tinha acabado de reinvidicar igualdade com o Pai tanto por chamar Deus Seu próprio Pai em termos muito especiais assim como reinvidicar o mesmo direito de trabalhar no Sábado como os Judeus entendiam que Deus fazia para manter o universo; segundo em João 10 depois de Jesus reinvidicar que Ele e o Pai são um em seu papel de trazer salvação para os eleitos de Deus - Suas "ovelhas". Em ambos casos João descreve claramente que estas reivindicações deveriam ser entendidas como reivindicações de igualdade com Deus - poderia 8:58 então ser diferente?
Em João 13:19 a introdução da frase em correlação com a revelação de eventos futuros assim como é encontrado em Isaías, mesmo ao ponto de quase citar a tradução da LXX, é de longe muito específico para ser negligenciado. E em 18:5-6, João repete a frase no verso seis para ter certeza que o leitor entendesse a razão para os soldados caírem para trás. E porque cairiam os soldados para trás se não pelas impressionantes palavras de Jesus? Algumas das explicações naturalistas trazidas para este incidente são tão ridículas como absurdas. O significado de João não pode ser confundido.
Se cada um destes casos forem examinados exclusivamente em uma redoma de vidro, separados dos outros, sem nenhum pensamento do livro inteiro de João, alguém pode ver como seu significado coletivo seria perdido. Mas esta não é a forma da interpretação erudita. Estes argumentos não são feitos em um vácuo - eles são colocados em um livro que é rico em significado e propósito. Foi bem dito que João intencionava que o Evangelho inteiro fosse lido através da "janela interpretativa " do prólogo de 1:1-18. Dados os ensinos daquela passagem, alguém pode seriamente duvidar do significado de ego eimi nas passagens examinadas acima? Parece que não.
Conclusão
Poderia de forma justa ser admitido que um pulo imediato e desqualificado do ego eimi de João 8:58 a Êxodo 3:14 não seria sábio. A conexão que é mais própriamente traçada é a que é dada aqui, aquela ego eimi/ani hu que é encontrada em Isaías. A conexão entre Isaías e Êxodo 3:14 é tão óbvia que é inegável.
Nós temos visto que João usa ego eimi em mais de uma forma - a maioria do tempo provendo um predicado. Mesmo estes são surpreendentes em sua majestade a respeito da pessoa de Cristo. Aqui se diz que Jesus é o caminho, a verdade e a vida; a luz do mundo; o pão da vida e o bom Pastor, de cada um deve ser notado que há paralelos em declarações feitas por Yahweh no Velho Testamento. Mas este artigo foi dedicado àquelas passagens onde a frase é usada em um sentido específico - em um sentido "absoluto".
Ao examiná-los nós temos visto que eles encontram suas origens e embasamentos no uso do termo hebraico ani hu no livro de Isaías e sua tradução como ego eimi na LXX. Nós vimos o paralelo próximo entre Isaías 43:10 e João 13:19, tanto na forma como no conteúdo do pensamento.
Nós temos também visto como o próprio contexto das passagens - o cenário e ensino do livro inteiro de João - faz da identificação de ego eimi e sua apresentação resultante da deidade de Cristo inevitável. Nós temos visto como João propositalmente enfatiza estas frases, nos ajudando a compreender seu significado.
Concluindo, nós fazemos bem em ver, então, com este entendimento em mente, nas palavras de Jesus em João 8:24: "a menos que vocês creiam que Eu sou, vocês morrerão em seus pecados". Jesus aqui dá a nós o conteúdo e objeto da fé salvífica - fé, fé real é a que vem ao Jesus real. Uma fé que exige uma mudança em Jesus antes que um compromisso seja feito não é bem uma fé real. Os Judeus que estavam com Ele durante esta conversa seguramente não teriam negado que Ele era um homem - mas isto não era suficiente para ter fé. Alguns bem recentemente proclamaram Ele como Messias - mas isto não é suficiente para ter fé. Alguns poderiam aclamá-lo como um profeta ou um operador de milagres, abençoado por Deus - mas isto não é suficiente para ter fé. Alguns hoje dizem que Ele era um grande mestre e filósofo moral - mas isto não é suficiente para ter fé. Alguns O chamam "um deus" ou um grande anjo - mas isto não é suficiente para ter fé. Não, o próprio Jesus formulou a doutrina - a menos que se creia que Ele seja quem Ele diz que é - o ego eimi - se irá morrer em seus próprios pecados. Não há salvação em um falso Cristo. Se nós temos que ser unidos a Cristo para ter vida eterna, então devemos ser unidos ao verdadeiro Cristo, não uma representação falsa. É por causa do amor que Cristo declarou em João 8:24. Devemos fazer bem em dar atenção a Suas palavras.
Fonte: http://vintage.aomin.org/EGO.html
Notas
1. Estes são: João 6:35, 6:41, 6:51, 8:12, 8:18, 10:7, 10:9, 10:11, 10:14, 11:25, 14:6, 15:1, 15:5.
2. Veja F. F. Bruce, The Gospel of John, (Grand Rapids: Wm. B. Eerdman's Publishing Company, 1983) página 193.
3. Philip Harner, The "I Am" of the Fourth Gospel, (Philadelphia: Fortress Press, 1970) página 4.
4. A. T. Robertson, A Grammar of the Greek New Testament in the Light of Historical Research, (Nashville: Broadman Press, 1934) páginas 879-880.
5. Veja A. T. Robertson, Word Pictures in the New Testament, (Grand Rapids: Baker Book House, 1932) 5:158-159.
6. C. K. Barrett, The Gospel According to St. John. (Philadelphia: Westminster Press, 1978) página 342.
7. Veja J. C. Ryle, Ryle's Expository Thoughts on the Gospels, (Grand Rapids: Zondervan Publishing House, n.d.) página 573 assim como A. T. Robertson, Word Pictures in the New Testament 5:159.
8. "Irenaeus Against Heresies" em Philip Schaff, The Nicene and Post- Nicene Fathers, 14 volumes. (Grand Rapids: Wm. B. Eerdman's Publishing Company, 1983), 1:478.
9. "Origen Against Celsus" em Alexander Roberts e James Donaldson, The Ante-Nicene Fathers, 10 volumes. (Grand Rapids: Wm. B. Eerdman's Publishing Company, 1981) 4:463.
10. "A Treatise of Novatian Concerning the Trinity" em Roberts e Donaldson, The Ante-Nicene Fathers, 5:624-625.
11. Crisóstomo, "Homilies on St. John" em Schaff, The Nicene and Post- Nicene Fathers, 14:199.
12. Henry Alford, New Testament for English Readers, (Grand Rapids: Wm. B. Eerdman's Publishing Company, 1983) 2:547.
13. Veja Harner, The "I Am" of the Fourth Gospel, páginas 6-36.
14. Esta conexão é ou diretamente feita ou aludida por Leon Morris, The New International Commentary on the New Testament: The Gospel According to John, (Grand Rapids: Wm. B. Eerdman's Publishing Company, 1971) páginas 447, 473; por Merrill C. Tenney, The Expositor's Bible Commentary: John, (Grand Rapids: Zondervan Publishing Company, 1981) página 99; e por F. F. Bruce, The Gospel of John, (Grand Rapids: Wm. B. Eerdman's Publishing Company, 1983) páginas 193, 288.
15. Morris, The Gospel According to John, página 473.
16. M. James Penton, "The "I Am" Of John 8:58" no The Christian Quest, Inverno, 1988, página 64.
17. R. C. H. Lenski, The Interpretation of John's Gospel, (Minneapolis: Augsburg Publishing House, 1943) páginas 614-615.
18. Um bom exemplo é dado por C. K. Barrett: "Não é contudo correto inferir ou para a passagem presente ou para outras nas quais ego eimi ocorre que João desejava igualar Jesus com o supremo Deus do Velho Testamento... Note que no versículo 28 é seguido por 'Eu não faço nada de mim mesmo, mas como o Pai me ensinou eu falo destas coisas... Eu sempre faço as coisas que O agradam', e em 13:19 por 'Aquele que me recebe recebe Aquele que me enviou' (13:20). Jesus é o servo obediente do Pai, e por esta razão revela perfeitamente Ele. ego eimi não identifica Jesus com Deus, mas chama atenção para ele nos termos mais possivelmente fortes". A suposição da unipersonalidade de Deus assim como a subordinação ontológica do Filho que dá base aos comentários de Barrett e obscurece sua exegese normalmente clara, é notável.
19. Como citado por Ryle, Expository Thoughts on the Gospels, páginas 531-532.
20. Leon Morris, The Gospel According to John, página 473.
21. B. B. Warfield, The Person and Work of Christ, (Philadelphia: Presbyterian and Reformed, 1950), página 60.
22. Ryle, Expository Thoughts, pg. 573.
23. Martinho Lutero, "Sermons on the Gospel of John Chapters 6- 8" em Luther's Works, Jerislav Pelikan, editor, (Saint Louis: Concordia Publishing House, 1959) página 365.
24. A. T. Robertson, Word Pictures, 5:158-159. 25. William Hendrickson, New Testament Commentary: The Gospel of John, (Grand Rapids: Baker Book House, 1953) página 67.
25. William Hendrickson, New Testament Commentary: The Gospel of John, (Grand Rapids: Baker Book House, 1953) página 67.
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